segunda-feira, janeiro 01, 2007

desamanheceres


As coisas do mundo são mais bonitas quando amanhece. E não se trata de ignorar toda a boniteza que há num pôr-do-sol, rasgando o céu em amarelo e se derramando em laranjas e rosas - eu mesma tive um amor com vista para o pôr-do-sol. Mas uma manhã clara, que vai desvelando aos poucos as cores das coisas, que quando chega em azul é como se escancarasse uma cortina e revelasse às pessoas o proscênio do mundo, para logo surgir em sol, é algo delicadamente apoteótico. Pois que é possível delicadeza e apoteose. Eu quase chego a ser feliz de manhã. Sonolenta, distraída e delirante, mas quase feliz. De manhã eu gosto de longos banhos de chuveiro, de rio, de mar. De manhã eu ainda não cheguei a sentir tristeza de solidão, melancolia, susto, decepção ou medo de escuro. [a solidão é doença que me aparece notívaga.] De manhã a vida parece menos irremediável. As manhãs me fazem enxergar cristalino, quando ainda não há tempo suficiente para lembrar aos olhos dos rancores, num progressivo escurecimento do coração até chegar a hora de dormir, e sonhar, e esquecer-se em si para relembrar. Há de se aprender a amar o sol, apesar de todo o verão, e isso não significa felicidade enlatada, mas só um pouco de aprender a amanhecer os olhos do mundo em um pouco de paz. E sim, às vezes é tudo ao avesso, e às vezes eu minto. Mas cada vez menos para mim mesma.