sexta-feira, agosto 05, 2005

the blue violinist, 1947


Porque eu agora tenho o livro mais bonito do mundo e ele se chama Memórias Inventadas e ele é tão fantasticamente lindo que eu estremeci a primeira vez que o vi e estremeci de novo quando o ganhei e estremeço a cada vez que abro sua caixinha, desato o laço de fita oferecendo em presente suas folhas e passeio por suas memórias, uma a uma. E então que eu o copiarei descaramente e comprei postais do Chagall para começar a minha invenção que se chamará a pequena caixa dos milagres, e nela terá postais, muitos postais, do Chagall e do Hopper e do Klimt e das mulheres antigas e de cidades e de pessoas e de teclas de piano e bilhetes e trechos de cartas e iluminuras e poemas do Manoel de Barros e vertigens da Clarice e pedaços minúsculos do que houver de mais bonito em mim e eu abrirei minha pequena caixa dos milagres a cada vez que estiver precisando de um e nunca mais nunca mais nunca mais eu me sentirei irremediada porque estará ali, ao alcance das minhas mãos, e eu abrirei minha caixinha como quem enxerga por uma fresta do coração de alguém e espera desesperadamente encontrar algo que lhe possa salvar a alma e eu tirarei um milagre só para mim e ele terá a mais linda cor violeta a violeta que beira o abismo do azul e um homem tocando violino para um pássaro pousado no seu ombro e eu direi só mais um, por favor me dê mais um milagre, e a minha pequena caixa dos milagres me dirá só uso a palavra para compor meus silêncios e eu não precisarei de mais nenhuma explicação no mundo.
A vida é tão simples que eu assusto.